quinta-feira, 31 de maio de 2007

A PROSA VOADORA DE DIANA MENASCHÉ

O mundo da literatura é realmente incrível. Num instante, não temos conhecimento da existência de determinado escritor, poeta. De repente, lemos algo casualmente e é como se conhecêssemos os textos do autor, de longa data.
Experimentei isso recentemente, quando li um conto da escritora Diana Menasché. Bastou um único conto para que sua poética se refugiasse na minha alma, e me tornasse dependente. Dependente de algo estimulante, instrutivo. Dependente de textos curtos que traduzem a alma através da linguagem da beleza.

Quem não conhece Diana Menasché, deve rapidamente conhecê-la, acessando seu interessante blog (www.dianamenasche.blogspot.com), que tem o sugestivo título de LIVROVOADOR - O LIVRO É INSTRUMENTO DE SOPRO. Onde encontrar algo mais moderno, lírico e conciso ao mesmo tempo? Há poucos textos publicados, pois o blog é recente. Entretanto, é possível encontrar preciosidades como o miniconto "O Livro Voador", uma espécie de texto híbrido - poema em prosa - onde a utilização de paralelismos (repetições) denuncia o estilo dialético, debatedor, da autora:

"Quando chove, os trovões o ferem...
Quando é tarde, ele dorme no ar.
Quando é cedo, ele espera - até as lojas fecharem...
Mas se ninguém o abre, ele se encolhe atrás do disco voador."

Cada linha é um verso formado pela repetição do "quando", que condensa uma explicação própria, até desaguar na explicação final. O paralelismo remete às águas correntes de um rio. Vê-se, claramente o cotidiano ser transformado em sonho. É o cotidiano literarizado. Isto é visível, também, ou principalmente, no miniconto "Dez Farpas Encravadas", sobre a hipocrisia, publicado neste blog, na SÉRIE MINICONTOS TEMÁTICOS, em 30/05/2007. Título forte que condensa o texto cortante, penetrante. Belo.

Os contos de Diana Menasché são sutis, inventivos. São contos que permitem enxergar a resposta do presente. Presente, enquanto tempo. Presente, enquanto dádiva.
O valor literário de um texto pode ser medido quando uma situação simples, corriqueira, é captada, fotografada e transposta com beleza. O conto "Faxina", é um exemplo típico:

"Vai o pó pelos caminhos dos corredores, vão os pedaços de madeira pelos ralos da cozinha, vão as fitas de vídeo para o elevador social, os tecidos velhos para os fundos dos fundos da casa, a louça antiga para o congelador. (...) "(...) Vão os livros para o brechó, os cadernos para a casa da Maria. (...) "(...) Eu quero saber onde está o meu destino, o meu pedaço nesse mundo, o meu consolo de solidão."

No conto, o ato de limpar, arrumar, guardar, procurar, remexer, ganha dimensão reflexiva, rasgo psicanalítico. A necessidade de uma faxina material é a mesma necessidade de uma faxina emocional, rememorar o passdo e expurgar o que não é mais útil. Encontro do destino, inventário que há por vir. Encontro do espaço geográfico da vida, presença marcante. Encontro do que pode suplantar a solidão. O conto em si, é um monólogo. A prosa flui, marcante, cortante, dilacerante, em cenas seqüenciais. A prosa de Diana Menasché dialoga com a dramaturgia. Não é preciso ler vários contos para perceber isso. As cenas estão prontas, à espera da interpretação.

A prosa de Diana Menasché é voadora; voa sobre o cotidiano, as situações aparentemente banais e capta as cenas, como um satélite, literarizando, mostrando o ritmo acelerado da vida, a sentença que a vida impõe, como no conto "Frangalhos":
"(...) Mova-se ou a vida te come."
Síntese da condição humana. Assim pode ser descrita a prosa voadora de Diana Menasché.
(Arte: "Mulheres na noite", de Joan Miró)

(Elson Teixeira Cardoso)

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